quinta-feira, 12 de junho de 2014

As Regras da Exceção




Se todo mundo está mobilizado por algum motivo comum e você não está e, simplesmente, não entende porque todos estão, então, você é o que se pode chamar de esquisito. Mas não se preocupe. Nem sempre é ruim ser o esquisito, muitas vezes você é e nem percebe, porque não fica tão à mostra e não causa grandes problemas senão em ocasiões específicas, como em datas comemorativas, o que permite a você viver uma vida quase normal, a passar por alguém considerado normal. No mais, fique tranquilo, afinal, dentro do contexto certo (ou dizendo melhor, errado) todo mundo é esquisito, talvez daí se explique a busca por ambientes sempre adequados ao que somos.

Tenho quase certeza de que algum pressuposto antropológico deve asseverar o seguinte: o mais da gente não se pergunta sobre o que lhe parece habitual, mas somente sobre o que a isso escapa. Ao que escapa, sim, ela indaga, questiona, confronta e tudo mais. Assim, independente de quanto, quando, onde e por que você é esquisito, você não vai poder fugir, das perguntas, dúvidas, curiosidades e constantes questionamentos a respeito da sua condição, não sempre, é claro, mas naqueles momentos especiais em que sua esquisitice é evidenciada.

Outro pressuposto da antropologia, certamente, deve sustentar um complemento àquele já supracitado, postulando que enquanto diferenças mínimas tendem a ser até fortemente confrontadas em ambientes onde sejam inusitadas, por outro lado, dentro de certas conjunturas a prática de absurdos não é apenas amplamente aceita pelas comunidades humanas, mas também defendida como normal, natural e por frases do tipo: é assim mesmo.

Quando é carnaval, por exemplo, ninguém pergunta ou se pergunta por que aquele cara peludo como um urso, acima do peso, está de lingerie vermelha salto alto, maquiagem pesada e peruca. Carnaval é assim mesmo. Esquisito é quem não vai. E se você diz que não gosta de carnaval, dá para ouvir até as paredes perguntando: Por que não? É carnaval. Estão todos preparados para os quatro dias mais agitados do ano, já compraram suas lingeries e estão contando os dias, as horas, os minutos para o momento. Você não. Alguém, pergunta o que você vai fazer no carnaval, você diz: nada. E é aí que começa: como assim nada?

Hoje é dia 12 de junho, dia dos namorados, outro ótimo exemplo, declarações e mais declarações de amor pipocando nas redes sociais, as floriculturas estão cheias como nunca, surpresas estão sendo preparadas, alianças compradas. Casais que estão brigando a meses vão jantar, ela ganhará flores e perfumes, ele um sapato, um relógio ou algo do tipo. Os solteiros e solteiras sentem mais que nunca acentuadas as suas solidões, os que acabaram relacionamentos recentemente, estão prestes a voltar atrás. Mas, apesar de tudo, você não está nem aí. É claro que vão perguntar: por que você é tão insensível?

É tempo de Copa. Hoje, aconteceu o primeiro jogo do Brasil. O que justifica facilmente vestir a camisa da seleção, comprar pequenas cornetas e passar a manhã inteira soprando acordes estridentes no ambiente de trabalho, é Copa gente, é Brasil! Os bolões estão organizados, os humores exaltados, esquecidos os empecilhos (protestos? Que protestos?), os açougues venderam toneladas de carne e carvão, as distribuidoras se esvaziaram de cerveja, as casas de fogos de artifício tiveram mais movimento que no Ano Novo, é Copa, é Brasil. Aí, alguém chega e pergunta: onde vai assistir o jogo? Você diz: nem vou. Por que não? Você ouve de uma pessoa, mas reconhece fácil o coro dos populares.

Pelo que vejo, muita gente que não gosta de futebol vai participar dos festejos, vai ver os jogos e comentar os principais lances. Todo mundo vai, ora. É assim mesmo, tem gente que prefere discrição e que leva a sério aquele antigo ensinamento: se não pode vencê-los, junte-se a eles. Outros vão aproveitar o momento para chocar, para enfatizar o quanto é diferente e alternativo e aproveitar o ensejo para ventilar pelos cantos do mundo real e virtual como sofre por ser assim e como a vida é difícil pra quem é torto.

Para você, que não gosta de futebol e nem vai fazer nem uma coisa nem outra, que é considerado o esquisito dos esquisitos por não responder como normalmente respondem à pressão da dinâmica social, deixo um conselho muito simples: seja o esquisito sempre, do café da manhã à hora de dormir. Acredite em mim, com o tempo, vão se acostumar com você, e vai chegar o dia em que, habituados com seu modo de ser, todos dirão: ele é assim mesmo. É assim que faço.

Nenhum comentário:

Postar um comentário