sábado, 14 de junho de 2014

Quando A Fala Não Fala





Quando falamos, falamos de corpo inteiro. Não só a manipulação da voz que sobe, desce, engrossa, afina, demora, se apressa, como também os movimentos das mãos, a postura, os olhares, as caretas e por aí vai, constituem um incrível conjunto de acessórios que tornam o uso cotidiano da Língua bem fácil, possibilitando um elevado nível de comunicação. Escrever, contudo, não tem voz, nem braços, nem rosto e aí está uma das dificuldades em se utilizar da escrita para comunicar emoções.

Há daquelas pessoas teatrais que ao falar chegam até o limite da expressão corporal, pessoas que falam com um movimento de sobrancelha, um pequeno movimento dos dedos ou uma rápida mudança de feições, que não abrem a boca apenas para expelir palavras, mas também pra fazer barulhos. Elas são de um modo tal que logo nos admiramos com sua expressividade e não é difícil nos perguntarmos: como elas conseguem? Às vezes, sem nos dizer nada, elas nos dizem tanto!

Pois esse tipo especial de pessoas pode encontrar grandes problemas ao se deparar com a elaboração de um texto. Afinal, como demonstrar raiva sem as mãos para erguer, as sobrancelhas para desabar sobre o meio dos olhos e a boca para envergar de ódio? E como expor a tristeza proclamada pelos ombros caídos, o andar vagaroso, as feições melancólicas e a voz sumida? Aqui, são essas pessoas que se perguntam ao ler um texto repleto de emoções: como eles conseguem?

Vez ou outra, vida afora, passamos pelo inusitado de não conseguir dizer o que queremos dizer, a fala não chega, os gestos não indicam, e aquilo que deveria transitar como sempre, para e fica. Geralmente, acontece quando pretendemos comunicar aquele conteúdo especial e impreciso que no âmago do nosso ser aguarda o momento certo de ir lá fora, quando surge aquela inquietação difícil de definir, experimentada em conjunto com a vontade imprescindível de expressar.

Se nos metemos a escrever é pior ainda, na escrita não cabem olhares, gestos, feições, só palavras. Bilac, parnasiano mestre em dizer o que geralmente não é dito, já disse uma vez: O pensamento ferve e é um turbilhão de lava, a Forma, fria e espessa, é um sepulcro de neve, e a palavra pesada abafa a ideia leve que perfume e clarão, refulgia e brilhava. Não é algo comum? O pensamento à toda, e o expressar à nada. Qualquer pessoa cedo ou tarde se depara com situações assim, de querer e não conseguir falar ou escrever.

A quem escreve, em prosa ou poesia, e tem como objetivo transmitir emoções, pensamentos ou seja lá o que for, consiste num desafio cotidiano encontrar na palavra escrita equivalentes para o “fervor” do que sente ou pensa, de outra forma, de que vale, a um escritor, ter um mundo interno exuberante que a qualquer um deixaria boquiaberto se não pode ser comunicado a mais ninguém?



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