terça-feira, 2 de setembro de 2014

O Povo de Krikkit






1.
Eu não sei de onde vem isso,
talvez constitua o lado obscuro
da humanidade que gostamos
tanto de comemorar, de chamar
sublime, e seja um dos seus aspectos
inalienáveis, que podemos calar,
desviar, reorientar, esconder, disfarçar,
mas não, nunca, de modo algum,
desaparecer com ele.

Talvez não seja mais que um
tipo de insanidade que se instala
no sujeito e acabe orientando
todas as suas frustrações
acumuladas ao longo de
uma vida ruim, ou de uma
vida inteira vendo as coisas
de um modo equivocado,

Uma vida não precisa ser ruim
pra alguém achá-la ruim, há
pelo mundo afora gente insatisfeita
que nenhuma satisfação menos
que psicótica ou lunática
é capaz de agradar e mesmo
essa, ainda fica devendo um pouco.

Então, o sujeito que está cheio de tudo,
ache aí, uma forma de se esvaziar,
de reduzir a tensão dentro da
própria cabeça.


2.
Talvez seja apenas um fato
rotineiro, potencializado pela
globalização, pelo contato
de vários pensamentos, culturas
modos de viver diferentes, etc,

A gente precisa de verdades
para levar a vida, não tem jeito,
a gente leva algumas coisas a sério,
muito a sério, demasiadamente,
se agarra a elas pra não afundar,
pra se salvar do afogamento,

Mas essa aproximação da diferença,
dos diferentes, todo mundo num espaço só,
como que diz que as verdades são
múltiplas, são muitas, é muito relativo,
daí que alguns enlouquecem por
se dar conta que sua grande verdade
é só mais uma verdade num mundo
entupido até o gargalo de verdades.

Eles queriam que a sua verdade
fosse a única verdade,
porque só assim, o mundo faz
sentido. Então, eles lutam
pra que, não sendo a única,
seja, pelo menos, a maior.

O povo de Krikkit até estava bem,
a seu modo, na clausura da
gigantesca e densa nuvem de poeira
que envolvia seu planeta e seu sol,

Mas naquele dia uma nave atravessou
os céus obscuros de Krikkit
e eles acabaram descobrindo que
não eram os únicos no Universo,

Não podiam lidar com aquilo,
o que fizeram?

Decidiram que voltariam a ser:
fizeram armas e se impuseram
a missão de destruir todo o resto.


Douglas Adams sabia do que
estava falando.


3.
Eu acompanho o mundo
e não sei dizer se ele está pior,
ou se isso é apenas uma impressão
causada pela internet e a presença
maciça de celulares com câmeras,
e ele tem sido assim, desde que o homem
não era mais que um símio de pé.

O fato é que as pessoas estão loucas,
ao mesmo tempo que gritam frases
feitas por um mundo melhor, defendem
os valores que a mídia fez unânimes
com toda a violência de que são capazes,

Você não vai ver ninguém gritar
num desses vídeos pela internet:
Vamos pegar e lhe ensinar
com amor e pacatez,
a leveza do convívio e
o bom de ser pacífico.


Não, você ouve:
Espanca, espanca, espanca!
Tem é que matar mesmo,
mata, mata, mata.


Um imbecil maltrata um cachorro,
uma idiota é racista, um outro
está vociferando coisas contra
gays,

Então, todos os ódios se erguem,
e ganham vozes e braços e querem
justiça, querem sangue.

Talvez, você não acredite
em mim, meu amigo, mas
as pessoas estão desesperadas
e o que vemos são as mais
primárias, puras e simples
faces do desespero.

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