quinta-feira, 23 de outubro de 2014

A Mulher Inexistente





Ela diz que queria ser gostosa
como aquela atriz de cinema,
peito perfeito, bunda perfeita,
aquelas feições sensuais
e aquele jeito de andar, altivo,
como que pisando cabeças
humanas,

Mas a verdade é que o que ela
quer é o que ela acha que teria
caso tivesse o que aquela
atriz de cinema parece ter,

A atenção que nós sabemos
qual é, os olhares, os cortejos,
as facilidades, o mundo aos
pés da sua beleza,

Ela está cansada de ser
a simpática, a legalzinha,
a bondosa, gentil e honesta,
de ser mulher pra casar,

E enquanto sonha seu sonho
de ser gostosa, ela ignora que por
trás daquela imagem de atriz
de cinema muito gostosa
há uma mulher

Que quer um pouco menos
de assédio, um pouco menos
de excesso, um pouco menos
de drama diante da humanidade
que dia a dia vai lhe pondo pés
de galinha e alguma celulite
e flacidez,

Que quer um pouco menos de
photoshop e se acha terrivelmente
triste por ninguém vê-la como ela
é, e todos os olhos e assobios
e gracejos serem, na verdade,
para alguém que sequer existe,
a não ser no cinema e nas
capas de revista.

E enquanto, a atriz de cinema
fala ao psiquiatra caro
da clínica de reabilitação sobre
a mulher que deseja ser,

Ignora que se fosse essa mulher
talvez estivesse agora mesmo
desejando ser quem é e estar
no exato lugar onde está,
sob os mesmos holofotes,

Penso que se, um dia,
elas se encontrassem
pra conversar, pra se conhecer,

Algo aconteceria, mudaria,
seria bom pras duas e talvez
elas rissem e concordassem
que há algo de muito errado
nisso tudo, nessa loucura toda.


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