sábado, 29 de novembro de 2014

Fim de Semestre











Se você quiser saber do que é realmente capaz um acadêmico, então, o acompanhe ao longo das duas ou três últimas e angustiantes semanas do semestre. Antes disso, pela faculdade afora, impera o mais descontraído e despreocupado clima. Na hora do intervalo, os alunos conversam sobre tudo e nada, uma festa aqui, uma festa ali, um jogo, um filme, uma notícia curiosa vista na internet. Muitos deles estão vendo vídeos no celular, compartilhando fotos, enfim, se ocupando das mais variadas tarefas exceto aquelas que tem a ver com a faculdade. Dentro das salas, não é muito diferente.

Você anda pela faculdade e em todos os rostos vê a mesma expressão suave de alegria e contentamento, e é claro que você se deixa contaminar e vive na mais total tranquilidade, como não houvesse provas, relatórios, testes, e tudo mais. Todos estão bonitos e faceiros, as mulheres têm os cabelos bem penteados e as caras cheias de maquiagem, os homens também estão alinhados e de repente, você se sente de volta ao Ensino Médio. Todos os assuntos são abordados exceto qualquer um que tenha a ver com as disciplinas estudadas e o corpo discente, desligados dos temas estudados, se mistura como fosse um só.

Por esses dias sossegados, a situação só é difícil para quem é aplicado. Ninguém está nem aí pra eles. Os demais alunos se reúnem e falam dos CDFs, eles estudam muito e não curtem nada, a vida é muito mais que faculdade. E esses pobres e esforçados CDFs que nunca têm tempo para ir num churrasco porque aproveitam o tempo livre para (acredite se quiser) estudar, que andam sempre preocupados com apostilas e livros, que sabem de cor todas as matérias que estão cursando, os horários e as salas, que realmente prestam atenção no que os professores estão falando são considerados uns bestas sem vida, a classe mais sem valor do lugar, abaixo até dos esquisitões e das chatas.

Já ouvi alguém dizer pra um deles, cara, assim tu nunca vai pegar ninguém… O argumento está mais do que correto, ou será que você conhece alguém que conseguiu ser o pegador lendo muitos livros e tirando notas boas? Eu pelo menos já vi caras serem populares por serem engraçados, por terem braços da grossura de coxas, por tocarem duas músicas no violão, por andar de skate, por se vestirem como idiotas. E acredito que seja parecido com as mulheres inteligentes.

Seja como for, a maioria do tempo eles estão sendo ignorados e a faculdade é mais um lugar para interação social que para qualquer outra coisa, contatos são feitos, encontros, churrascos e outros eventos sociais são marcados. As pessoas estão ali para ver outras pessoas e serem vistas por elas, para ficar sabendo o que tá rolando, pra ficar por dentro, pra fazer uma pose e por aí vai. Na hora do intervalo, que geralmente dura 20 minutos a mais que os 10 sugeridos pelo professor o que se vê não é muito diferente de uma praça, gente pra lá e pra cá, falando alto e comendo. 

Mas então, chega o fim de semestre e tudo muda. É como anunciassem o impacto de um cometa sobre a Terra, a vinda de Jesus, o Bug do Milênio, a volta do É o Tchan. A atmosfera calma de descontração é logo substituída por outra, mais densa, séria, tensa, acadêmica, regulamentada pela ABNT. Os passos se tornam mais rápidos, as trocas de cortesias perdem a prioridade, tornam-se ligeiras e quase que mecânicas. Todos os cumprimentos usuais perdem o lugar para um e aí apressado e desarticulado. Por toda a parte tem alguém lendo uma apostila um livro ou um pdf. 

Os professores recebem muito mais atenção do que podem suportar e é claro que tiram seu proveito da situação. É o momento da sua vingança. O pessoal conhecido por chegar fora da hora, começa a chegar mais cedo e em vez de mexer no celular não tiram os olhos e os ouvidos de cima do professor. Há quem chore, há quem esqueça de pentear os cabelos, barbas por fazer e olheiras são comuns.

A xerox e a biblioteca se entopem e esse é o momento dos CDFs. Todo mundo quer falar com eles, quer saber deles, admiram sua dedicação e inteligência, querem adicioná-los no Facebook, no Instagram, no G+, no Whatsapp e em não sei mais o quê. Amizades desfeitas são refeitas, ofensas são retiradas e a paz prevalece. Alguns deles, sabendo como é e muito entendidos do que quer dizer a lei da oferta e da procura, fazem doce, se fazem de difíceis, a maioria entanto, deslumbrados, prostituem os conhecimentos adquiridos a duras penas por qualquer pedacinho de atenção.

Eu sei conheço os dois lados da história. Sou o que se pode chamar de aluno dedicado, leio na hora do almoço, não assumo compromissos no fim de semana pra poder estudar, presto atenção nas aulas e geralmente sei a matéria passada. Noutras vezes, estou muito nem aí, me perco na semana, não sei nem em que sala vai ser a aula ou que aula vai ser. O resultado disso é que de, vez em quando, perto do fim do semestre, há quem me procure como eu fosse uma agenda humana, querem saber datas de prova, de entrega de trabalhos, mais que isso, querem saber da matéria, querem ajuda, querem que eu explique e, eu no mesmo barco, digo: também tô querendo saber e rio. E aí, alguns agem como fosse minha obrigação saber de tudo e como não sei, ficam com raiva.

O tempo passa, as provas passam, trabalhos são terminados em cima da hora e entregues no último segundo, quando o professor já está saindo da sala, as notas são divulgadas e no fim, as férias brilham para todos, pra quem passou e pra quem não passou. E no semestre seguinte todos os que prometeram a si mesmos fazer diferente, que prestaria atenção, fariam os trabalhos, estudariam antecipadamente, fazem do mesmo jeito, como se tivessem escrito num roteiro, então, tudo de novo. E é assim que uma hora a gente acaba se formando.


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