sábado, 16 de agosto de 2014

Sorria e Acene



Eu venho de uma família muito pobre, tão pobre que não tinha nem com o que sustentar tradições. Assim coisas como Natal, Ano Novo, aniversário, festas juninas e todo o resto, me dizem muito pouco, quase nada. Mas nem por isso, ando por aí levantando bandeira a favor da abolição das datas comemorativas ou chamando de estúpidos aqueles que se empolgam todos quando chega este ou aquele feriado, ou o dia do nascimento, seu ou de um amigo, de um familiar. Um dia, o pessoal do meu setor organizou uma festa surpresa para o meu aniversário. Fiquei desconcertado de tão feliz, quase chorei. Noutra vez, minha mulher e meu melhor amigo organizaram uma saída surpresa. Então, eu sei como são importantes esses eventos.

Eu até gosto. Geralmente, as pessoas estão todas descontraídas e então, meu senso de humor não parece algo inadequado à hora ou ao lugar. Coisa de duas ou três semanas atrás, fui numa festa junina que, ao mesmo tempo, era aniversário de uma senhora. Foi engraçado que a senhorinha, na hora do seu discurso de depois dos parabéns, praticamente pediu pras netas lhe darem pelo menos um bisneto. Foi divertido, dançamos quadrilha, forró, pagode, eletro house e tudo mais, eu e minha mulher.

O problema é sempre a obrigatoriedade dessas reuniões, você tem que sorrir, tem que estar bem, faz parte do lance todo. E quando você não está, como é que faz? Você acaba se torna o chato da festa, está todo mundo brincando, bebendo, comendo, rindo à toa e você lá, procurando um canto pra ficar quieto, com fastio, sem vontade de falar ou rir. As pessoas reparam e vêm falar com você, mas você não quer consolo, amparo ou palavras de incentivo, você as conhece de cor e só quer ficar quieto.

Esses dias teve uma confraternização no trabalho, com temática de festa junina, eu não estava muito bem, um monte de contas pra pagar, aluguel, luz e internet, e o banco ainda tinha aprovisionado metade do meu 13º e outra metade do meu salário. Estava sem clima. Mas não fiquei na sala, porque sei como é, a gente diz que não vai e em pouco tempo, estão perguntando o que aconteceu. Também não ia dizer é, eu vou, já que não tem outro jeito, porque sempre tem jeito, pra fazer ou deixar de fazer algo convencional. Fui. E tem mais, às vezes, você está mal, então se deixa contagir pela alegria dos outros e fica bem, pelo menos naquele momento.

Teve um sorteio, foi engraçado até. A pessoa sorteada ia lá na frente, pagava uma prenda e ganhava uma trufa, era mais por causa da brincadeira mesmo. E de repente, eu estava lá, de braços cruzados, torcendo para o meu número não ser sorteado. Um pouco depois, já tinha a seguinte resolução: se meu número fosse chamado, eu ia fingir que não era o meu e esperar chamarem o outro número.

O meu normal é estar tranquilo e brincalhão, eu chego no trabalho e não importa se estou caindo de sono, dou bom dia para todos, começando pelas meninas da copa, que me dão o santo café de todo dia útil, mas isso é espontâneo, e só funciona quando estou sem preocupações demais. E embora, faça assim quase todos os dias, não me sinto obrigado a distribuir bom dias e tudo bem?.

Acho que fujo mesmo é da imposição de um humor, de um modo, de um estado. Por isso, não gosto que fiquem esperando que eu seja o intelectual 24 horas por dia, todos os dias do ano, assim como não gosto de ser o engraçadão em tempo integral, ou o poeta, ou o responsável. Eu sinto os dias e eles nem sempre são bons e eu nem sempre estou com vontade de falar sobre filosofia ou contar piadas, ou ficar com aquele sorriso abestado esticando os cantos da boca. 

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