sábado, 14 de março de 2015

Pedreira



1.
Passou o Dia Internacional da Mulher,
e foi aquilo de sempre, o grande dia da mulher,
da mulher que é meiga, forte e mãe,
da mulher símbolo do amor e da compreensão,
da doce, terna e carinhosa mulher,

Eu vejo e tenho pra mim que a maioria
das homenagens do dia da mulher é ctrl c ctrl v
das homenagens do dia das mães,
o que é bastante esquisito, o próprio
homenagear é esquisito,

Pense comigo, é dia da mulher,
e já se convencionou, que é dia
de comprar flores, bombons, pagar
um jantar num bom restaurante ou
algo parecido, e isso por quê?

É uma forma de agradecimento?
Ou será um incentivo capcioso
para que as lindas, fortes e mães
dos textos elogiadores continuem
assim e as demais, deem um jeito
de as imitar?

Parece uma tentativa de emperrar
a mulher onde ela está, num papel
secundário, a subornando com
presentes, fazendo parecer menos
importante que a homenagem o
trato de questões relevantes
para a mulher,

É algo como dar um doce
pra criança se aquietar:
“Toma aqui esse perfume,
e não me vá inventar conversa
sobre essa tal de emancipação,
não, hein?”


2.
Antes do dia 8, teve gente me
pedindo pra escrever um texto
em homenagem à mulher, minha
mãe inclusive, pra compartilhar
no facebook,

Não senti a menor vontade de escrever,
e por isso, não ia escrever nada a respeito,
fiz uma postagem engraçadinha
e pronto,

Mas aí, na quarta, eu acho, cheguei
em casa depois do trabalho e vi essa
mulher trabalhando numa obra aqui perto
e me deu vontade de escrever.

Ela estava logo ali depois do muro,
no quintal vizinho, de pé em cima de
um andaime improvisado, levantando
uma casa, tijolo por tijolo, com as
próprias mãos.

Era uma mulher jovem e robusta,
com uma camisa branca de mangas compridas,
abotoada até o queixo, por cima de outra camisa,
calça jeans e uns cuturnos enlameados,

Tinha um brinco discreto e
dourado na orelha, um boné
atochado na cabeça, escondendo
os cabelos todos,

Não era bonita, era simpática, tinha no rosto
aquela tranquilidade de quem já descobriu
que a vida não é fácil e que o jeito é perseverar,
e perseverar é insistir por muito tempo,
com muito esforço e muita calma.


3.
Era difícil imaginar que do jeito que estava,
suada e suja de cimento e barro,
servisse pra algum vídeo sobre o
Dia Internacional da Mulher, o grande dia
de todas as mulheres,

Sempre que penso em alguém,
sempre que especulo sobre alguém,
em como deve ser, como deve agir
e por aí vai, pego um pouco de todos
que já conheci e então, parto do pressuposto
de que pessoas são pessoas,

Por isso, parando para pensar nessa mulher
pensei que, como qualquer um, ela já mentiu,
já enganou e foi enganada, como qualquer um,
já teve seus deslizes, como qualquer um,
e certamente, já fez escolhas das quais
se arrepende hoje, como qualquer um,

O que a tornava ainda mais distante
da mulher a ser homenageada no 8 de março,
então, pensei: Que bom!



                                     
Gostou? Então, nos dê aquela mãozinha e compartilhe.
Valeu!

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