sábado, 23 de maio de 2015

Entretempos



1.
A gente não tem como saber
como vai ser daqui a um tempo
- como vamos ser, eu digo,
por mais força que a gente faça,
o que virá e como nos acertará,
a gente nem sabe, nem tem
como saber...

Temos nossas esperanças,
mas o que realmente pode
fazer o tecido dessas esperanças
nas mãos do acaso, tão boas
em desfiar?

O que o tempo fará da gente
e o que faremos de nós mesmos
é uma coisa que nos escapa, só
depois de estar lá é que saberemos
e talvez, nem tanto.

A gente também não tem
como saber como é que esse alguém,
que seremos, vai pensar
nesse outro alguém,
que vamos sendo agora.

Esses dias,
eu pensei nisso.


2.
Duvido muito que o pequeno Danilo,
estudante dedicado e ingênuo,
bestinha bestinha, imaginou
que um dia abandonaria a escola
e se tornaria um renomado
bebum de praça,

Duvido muito que esse bebum de praça,
que andava de cross, era conhecido
por Zé e se via na infância como um
perfeito abestado, um dia tenha se imaginado
escrevendo poesia, cursando psicologia
e acordando de segunda à sexta
às 6 horas da manhã pra trabalhar.

De algum jeito, aqui estou, e hoje
penso como será daqui a 5 anos,
como serei,

E daqui a 10 anos,
20 anos?

Eu fico pensando, como esse
Danilo do futuro vai olhar pra
esse Danilo de agora, o que
vai pensar dele?


3.
Meu amigo, Marcos, hoje me
disse que agir com maturidade
é uma boa forma de evitar
vergonhas futuras,
concordei com ele.

Ele pensou nisso depois de
me ouvir falar que tenho
mais vergonha de falar
que um dia já fui modelo mequetrefe
do que já ter andado pela praça do half
vestindo bermudas rasgadas e camisas
de campanhas eleitorais.

Mas eu fiquei pensando se o Danilo,
que fazia o curso de modelo, pensava
que um dia ia ficar sem jeito pra falar
sobre o assunto,

Pensei também se o Zé pensava
que um dia ia ver tudo de outro
jeito,

Nos dois casos,
acho que não.


4.
Hoje, eu tenho uma cabeça
bem diferente de todas as cabeças
que já tive, mas que é o conjunto delas,
resulta de um processo de contração
e expansão, de contínuas organizações,
crises e
reorganizações,

Com essa minha cabeça de hoje,
sei que muita coisa que o tempo traz, o tempo leva,
mas não leva por completo, qualquer tanto fica,
perdura, persiste em nosso convívio,
na gente.

Não se trata só de agir com
maturidade, nem só de evitar
vergonhas futuras, a gente
nem tem como saber o que
entenderemos por vergonhoso
no futuro,

Acho que se trata, na verdade,
de entender que o que fazemos,
o que vivemos, as coisas que
a gente passa e que passam
pela gente, não passam de todo,
de algum modo,
ficam.

A questão é: a gente se faz
do que é feito da gente,
então, é preciso sempre
ter em mente do que é
que nos queremos feitos.





                          
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