sábado, 3 de outubro de 2015

Emprego



A cena é essa:
tenho uns vinte e poucos anos
e depois de ficar na frente de uma empresa
das 5 e 30 até as 9 da manhã,
sou chamado pra falar com um cara.

Eu era um vagal
tentando mudar de vida
e achando que ia ser fácil.

Entro numa sala bonita
com ar condicionado e tudo
e digo de cara que estou ali
porque preciso de um emprego,

O cara ri um riso zombeteiro e diz que,
tirando pelas minhas roupas,
o caso é mesmo urgente.

Ele era um gordinho de cara vermelha,
camisa branca muito bem passada,
gel no cabelo, dentes perfeitos.

Eu era um marginal
que andava de cross, bebia cachaça com refri
na praça do half e tinha largado a escola
só porque deu vontade.

Sentado ali, ouvindo o cara rir,
imaginando qual dos parentes
dele tinha lhe dado o cargo,
imaginei também como ficaria
aquela carinha bem barbeada
depois de um murro bem dado.

Não dei o murro.

Juntei o pouco da pouca
dignidade que tinha, peguei
minha bicicleta velha e pedalei
até em casa segurando o choro.

Penso que pra qualquer outro
aquilo podia ser só mais um não,
mas eu estava desesperado,
e o desespero amplia tudo.

Se você nunca foi um desesperado,
não pode saber a euforia que traz
a menor possibilidade e a desolação
que vem depois que tudo dá em nada.

A gente tinha se empolgado, de verdade,
eu e minha mãe, com a possibilidade
de um emprego,

Conseguir um emprego
significava muita coisa,
ter um emprego
era ter outra vida.

Pra ter uma ideia, a gente
já estava pensando em como gastar
o primeiro salário e o que faria
com o 13º.

Mas aí, BANG!

Quando cheguei em casa,
contei pra minha mãe
que não tinha dado em nada,
ela pensou que era brincadeira.

Não era.





                                                      
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