sábado, 24 de maio de 2014

Ou Isso ou Aquilo?




         Ainda muito cedo, entendi que a estima de algumas pessoas pode custar muito do que somos, mais que isso: nunca vale a pena. Se você é um peixe e precisa deixar a água que tanto ama por alguém, pelo seu afeto, certamente, vai sempre se sentir um tantinho desconfortável. Se for para mudar por alguém, mudemos por quem nos ama, pelo seu bem, na medida do possível. Mudar para nos fazer amar, para nos fazer querer bem é se expor a vontade dos outros, nem sempre justa ou coerente. Quase nunca justa ou coerente, na verdade.

          Aprendi isso com meu pai, sem que ele me ensinasse. Aprendi a ler muito rápido e pulei de série, pequeno, gostava de brincar debaixo de um frondoso limoeiro, sozinho, inventando coisas, fazia cidades no quintal de casa, com estradas, pontes e garagens para meus carrinhos minúsculos, era bastante falador e inquisitivo, para não dizer desconfiado. Meu pai, em tudo elogiava os outros meninos dali, os que jogavam bola e que pareciam crianças normais, para o que eu tentava lhe mostrar, nada, senão um cansado "tá bom...". Como qualquer criança, queria o afeto do meu pai, sua admiração e pensando em modos de a conseguir, descobri que era só imitar os outros meninos. Pensando melhor, percebi que devia deixar as coisas que gostava, então, desisti da ideia.  

          Ainda no começo do ensino fundamental, já em Porto Velho, Rondônia, o entendimento já estava muito mais estabelecido e eu sabia que para fazer as coisas do modo como queria e ser como quisesse ser, não poderia aderir às expectativas alheias, aceitá-las, muito menos admitir, de imediato, as ideias dos outros a respeito de como eu devia ser ou de como as coisas eram. Eu era um estudante aplicado, mas gostava de responder os professores com gracinhas e (diziam eles) uma desrespeitosa arrogância, sem falar que na hora do intervalo participava de muitas das brincadeiras violentas que eram sediadas no Barão do Solimões. Eu respeitava os mais velhos, chamava-os senhor e senhora, em todo caso, desafiava seus entendimentos a respeito do mundo, da moral, de Deus e de tudo mais. Hoje, percebo que devia ser um peste mesmo. Acho engraçado.

          Passo por situação muito parecida com as que aconteciam na infância e que aconteceram em muitos outros momentos da minha vida (como quando era um bêbado e muitos ao meu redor diziam inútil ler tantos livros), como poeta, há um sem fim de pessoas que acham que sabem como devo agir, como devo parecer, o que devo pensar e sentir. Creio que não sabem. Tem gente que diz que o que escrevo nem é poesia e, é claro, que não estou nem aí para esses pensamentos restritos a respeito de como poesias devem ser. Mas hoje, sou muito mais paciente, embora não seja menos cínico. 

          Segundo penso a questão consiste no seguinte: se atendo às expectativas alheias, pelo menos ao que entendo como aquilo que esperam de mim, posso me sair bem melhor do que agora, já que serei facilmente reconhecido como poeta e minha poesia como poesia. Por outro lado, estarei preso aos flutuantes critérios multitudinários. Ao não atender às expectativas, entanto, tenho o que quero ter: liberdade. Para mim, consiste em algo fundamental, ir se descobrindo, se pensando, se sentindo e ser segundo o que estabelecer a partir dessa aventura. Mais que ir aderindo a ideias prontas e códigos de condutas contraditórios e mantidos como um mal hábito, prefiro ir vendo como é. Não me tornei poeta para deixar de ser quem sou. Aliás, não fosse o que sou e não teria me tornado poeta.

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