Ida ao Mercado

1.
Fui ao mercado comprar cigarros,
Derby, dizem é cigarro de bêbado,
cigarro é cigarro, não sei que glória
pode haver em chupar nicotina pra
dentro do corpo.

Na verdade, ninguém diz que tem,
mas a maioria age como tivesse.

A mesma coisa com a bebida,
se você bebe Duas Onças ou 61
com refrigerante numa praça,
é só mais um bêbado, se bebe
Red Label numa dessas boates

de 50 reais a entrada,

é um cara que sabe curtir a vida.

Se você fuma maconha na frente de
um terreno baldio é um noiado,
se toma LSD ou Ecstasy
numa rave com o ingresso
a 200 contos é só um jovem
fazendo o que os jovens fazem.

É como houvesse um modo
certo de fazer as coisas erradas.

Besteira.


2.
Quando fui, a despeito do sol batendo forte
sobre a rua quase deserta, do ar quente e sufocante
com aquele tanto de poeira de todos os dias,
umas nuvens grandes e escuras, pesadas
com não sei quantas toneladas de água
pra cair, passeavam pelo firmamento,
prestes a desabar.

Um menino tentava pôr um papagaio
no céu. Faz tempo que não sei
quando é ou não é tempo de papagaio,
a gente cresce e se ligando nisso,
se desliga de todo o resto.

No mercado, a mulher me olha
com tédio através dos óculos redondos,
mais uma compra, menos uma compra,
qual a diferença? É 6 e 50? É.


3.
Quando voltei, reparei
que alguém também ouvia Lana Del Rey,
Summertine Sadness,
o que eu ouvia ainda há pouco,
antes de botar uma camisa e sair.

A melancolia é uma linguagem universal,
eu penso e repenso logo em seguida,
talvez não, talvez seja só a mídia fazendo
o seu trabalho e eu só mais um influenciado…

A cena agora, mesmo sol, mesma poeira,
mesmas nuvens, mesma sensação, tomara
que chova logo.

Um menino maiorzinho
tenta tirar o papagaio engatado nos
fios elétricos, enquanto o menorzinho,
o mesmo que tentou empiná-lo,
aguarda entre ansioso e animado,
esperando o desfecho para se decidir.

Acabou triste, porque o papagaio
não saiu de lá inteiro. Acontece.

A vida acontece, onde quer que você
esteja ou não esteja, querendo ou não, 

ela acontece.